terça-feira, 9 de março de 2010

Relato de uma criança imigrante-Andreia Andrade

Chamo-me Andreia Andrade, sou Cabo-verdiana, tenho 9 anos e estou no quarto ano do ensino primário.
Moro com os meus três irmãos, pois os meus pais são imigrantes em Portugal á procura de melhores condições de vida e de um melhor futuro para os filhos.
Estes tinham como prioridade conseguir um visto para nós os 4. Após vários pedidos por parte deles, de assinaturas, de declarações e muito mais finalmente conseguem-no. Iríamos todos para junto deles.
Dias se passaram até tudo estar totalmente legalizado. Até que um dia tudo estava pronto para a viagem. Dia 11 de Novembro de 1999. Mas antes vou vos contar como foi a véspera desse dia. Algo que me marcou e me marcará até o último dia da minha vida.
Recordo-me de estar todas as pessoas a ajudar-nos a arrumar as coisas, a dar nos conselhos, a enviarem beijinhos p’ra este e aquele, de ver a minha avó, avô, tias, vizinhas e amigas de longas datas a chorarem desesperadamente. Foi doloroso separar e ver as pessoas de quem nos são próximas e importantes para as nossas vidas ficarem para trás… É indescritível a dor que se sente….
Mas falemos de coisas mais felizes. É dia da nossa viagem, estou bastante feliz por ir viver com os meus pais. Finalmente iríamos ser uma família de verdade…sem separações…
São por volta de dez, onze horas da noite o voo atrasou-se, mas chagamos são e salvos a PORTUGAL.
Vemos os nossos pais á nossa espera com uma felicidade imensa expressa nas suas caras.
Lembro-me que a minha mãe deu me um abraço forte e caloroso que já á muito tempo não me dava, uma vez que passava mais tempo em Portugal de que no seu próprio país. Mal me lembrava dela apenas tinha recordação da sua doce e meiga voz que falava todos os dias comigo ao telefone para saber como estava.
Depois da minha chegada vários dias se passaram até conseguir concluir a minha inscrição numa escola. Foram dias e semanas á espera… Até que um dia tudo estava preparado para a Andreia ir para a escola. Estava completamente aterrorizada recordo-me como se fosse hoje… o medo de ser rejeitada, o medo de não conhecer ninguém, o medo de como iria ser recebida, o medo de como iria me adaptar, o medo de como iria comunicar foi horrível! A minha cabeça andava às voltas, doía-me, o meu coração estava aceleradíssimo. Mas tinha que enfrentar a situação.
Não me recordo com precisão a que hora entrei para a aula, mas sei que entrei e sentei-me como todos os meninos. Estes olhavam me e eu sentia me cada vez mais intimidada.
A professora faz a minha apresentação!! Sinto me aterrorizada! Não sei como fazer, não sei como agir.. tudo era me estranho…
Passaram se uma semana desde que entrei para a escola e não tinha evoluído. Simplesmente não comunicava com ninguém..tinha medo…
A minha mãe por diversas vezes foi chamada á escola, pois a minha timidez não de deixara socializar.
Faziam de tudo para me tentar ajudar os meninos conversavam comigo, às vezes percebia-lhes às vezes não. Era uma frustração, mas lá dávamos um jeito.
A minha professora ajudava-me em tudo que pudesse e tentava integrar-me na turma.
Arranjaram me apoio educativo para que pudesse melhorar o meu português. Estava tudo a correr lindamente.
Chegou o fim do ano lectivo. A professora fala com a minha mãe que era melhor chumbar para que tivesse mais um ano para aprofundar o Português. Perdi assim um ano.
A partir daí nem tudo foi mar de rosas. Apesar de começar a dar me bem com os meus novos colegas e professores, a interagir mais quer com eles quer com outras pessoas e também a contribuir para as aulas algumas coisas começaram a correr mal.
Lembro me dos intervalos quando os meninos começavam a chamar me nomes relacionadas com a minha cor de pele e eu ficava fula da vida, porque simplesmente não conseguia perceber qual era a graça de gozarem só por ser deferente dos outros.
Comecei por achar horrível a escola, não tinha vontade de ir, no dia a seguir já sabia o que iria acontecer. Tinha medo do dia de amanha.
Até que um dia resolvi agir e usar as minhas forças para bater-lhes sempre que me insultavam. Foi a única solução garanto-vos..
E assim acabamos mais um ano.
Veio o 5º ano. Tinha mesmo uma falta de interesse pela escola enorme. Cada dia era pior que a outra. As piadas parvas que diziam e depois desatam às gargalhadas como se fosse algo de muito engraçado deixavam me louca. Quanto mais pedia para parar dava lhes ainda mais gozo para dize-las. Achavam graça chamar me “ alcatrão”, “pipoca queimada”, “Chimpanzé”, até chegarem ao nível mais baixo como” balde de me……” Confesso que são palavras que até hoje relembro com alguma mágoa sem perceber como é possível haverem pessoas tão baixas.
Mas tenho a agradecer a essas pessoas que passaram pela minha vida e me ajudaram a fortalecer e a crescer, pois ganhei muito com isso apesar de não o saberem. Só me tornaram mais forte, também amarga e insensível mas forte como uma rocha. OBRIGADO!!!
A partir do 5º ano encontrei sempre um engraçadinho que se divertia em elogiar o meu tom de pele. Até que um dia resolvi ultrapassar isso brincar também, mas não deixando ser desrespeitada.
Hoje estou no 11º ano e o máximo de que me chamam é “preta”, pois acho admissível, uma vez que é a minha cor e não tenho vergonha dela.
Hoje sou superior a essas brincadeiras e bastante feliz.

1 comentários:

Unknown disse...

Primeiro muito obrigado pelo coment. Segundo, após ter lido o teu relato, não posso dizer que não me emocionei. Realmente, tens uma grande história de vida e nada fácil sem dúvida. Agora o fundamental disto, é a força que tiveste para enfrentar todos estes obstáculos que se cruzaram na tua vida,foi simplesmente algo fantástico. É incrível como uma pessoa que passou por "n" situações, onde sofreu de racismo e tudo mais mas ultrapassou e hoje é a pessoa que é. Uma alegria incontável, uma amiga verdadeira, alguém feliz consigo própria e com uma força absoluta. É caso para ter admiração por ti. Força ai, sei que continuarás a ser a pessoa que és, e muito importante terás sempre ao lado as pessoas que gostam de ti e essas sim apoiaram-te e não te deixaram para trás, nem tampouco levarão em conta as pequenas diferenças que existem e nós tornam diferentes uns dos outros.


depois de dizer tanto bem acho que tenho de brincar um pouco e dizer que o meu fundo... tu gostas pq tbm tás in love xD

beijinhos andreia xD